sábado, maio 28, 2005

Bd bd

Há raizes que penetram tanto e tão complexamente que nada nem ninguém as consegue decifrar... É pior que um código... é a vida na sua mais gloriosa e fértil manifestação. Não quero ir mais longe. Quero ficar aqui. Sozinho. Entre matar-me e esperar por ti decido esperar. Aguardarei. Terei longas barbas branca e virás bater-me à porta perguntar-me por um pouco de solidão. Será bom rever-te e estar um pouco contigo.

sábado, maio 21, 2005

Liberdade

Segurava o corrimão das escadas da biblioteca. A sua mão não conseguia dar a volta total ao ferro protector. A sua mão era pequenina e ela uma menina. Descia sorrindo para a mãe que começou a subir. Muito boa aparência, saias pelo joelho e camisa que não lhe cobriam os ombros. Que mãe mais bonita. A filha viu a sua mãe ultrapassá-la e atingir o andar superior e dando meia volta seguiu-a em silêncio.
É tão bom ver uma criança livre; uma criança que exerce a sua liberdade seguindo o adulto sem que este tenha de a condicionar com um "vem!"
Aquilo a que chamamos de liberdade não deve estar muito longe desta definição extraída da situação relatada: de livre vontade fazer o que nos convém; acrescentando, para tornar mais completa a definição, que também somos livres para fazer o que não nos convém. E é talvez aqui que reside a máxima materialização de uma acção verdadeiramente livre e essencialmente humana: na liberdade de não fazermos algo que as circunstâncias nos pedia hedonistica e definitivamente para fazer. Sacrificar o prazer em prol da razão. Acto extremamente difícil de se concretizar; talvez por dentro de nós ainda viver um animal cujo instinto persiste em nos levar à simplória satisfação das mais básicas necessidades.
Pôrra que este texto saíu com o amargo aroma da filosofia...Por aqui me deixo ficar, gritando vivas à liberdade.

sexta-feira, maio 20, 2005

Fim de mais um dia

As nuvens, calmamente empurradas pelo vento, seguiam caminho rumo ao Norte. O vento que as empurrava era quente e fazia vislumbrar um fim-de-semana de sol.
As folhas das árvores brilhavam agitadas cantando baixinho uma melodia fresca de notas agudas. As pessoas passeavam sorrindo e descontraídas de mãos dadas aos seus filhos inquietos pela franca possibilidade de comerem daí a pouco um gelado de baunilha e chocolate. Os cães com coleira procuravam os vadios e juntos desatavam em correrias e brincadeiras. Alguns solitários deitavam o olho a raparigas belas que passavam ligeiras fingindo nada ver.
E eu ali, no parque, preguiçava deitado na relva no fim de mais um dia de trabalho, á procura de um motivo para seguir em frente. Adormeci e acordei. Já se tinha feito noite. A fome que sentia; Um bom motivo. Levantei-me e disse adeus a mais um dia.

quinta-feira, maio 19, 2005

Conflito

Não sei em que mãos vai rebentar esta bomba. Confesso que é difícil de dizer. Cada um de nós preferia que fossem as mãos do outro a estoirar. Eu as dela, ela as minhas.
Ela, no seu território e com um clã bem construído, contra mim, recém chegado ao ensino com pouca experiência da vida. Parece que lido com um animal, não com uma mulher.
Deixo aqui registado: A pessoa de quem falo é para mim cada vez mais horrível. Talvez isso seja um trunfo meu. Quem sabe?

sexta-feira, maio 13, 2005

O amor, para ela.

Depois do primeiro dos três telefonemas que fizeram ele pensou e sentiu que ela era a única pessoa com quem poderia casar.
Existe uma cumplicidade entre eles, uma harmonia, uma segurança não encontrada facilmente no mundo dele, em que tudo é esquivo, apressado, efémero.
Com ela o tempo pára e o momento é eterno, alonga-se no prazer de estar e de ser.
O amor deve ser algo muito parecido a isto que acontece entre eles.
Sim, eu sou o ele e este é mesmo para ela.

domingo, maio 08, 2005

Ovos sob protecção

Na praia onde às vezes vou nadar existe ao largo um rochedo enorme onde as gaivotas costumam poisar. Hoje, decidi ir até lá. A água estava boa os óculos de natação bem ajustados na cara e os braços preparados para o esforço.
Acontece que a três quartos do caminho duas aves vieram fazer um reconhecimento, voando por cima de mim a piar alto. Enquanto os vôos se tornavam cada vez mais rasantes eu continuava a nadar em jeito de desafio. Já tinha concluído que havia por ali ninho e tarefa protectora de progenitor. Eu chamo aquelas aves andorinhas do mar; acho que é mesmo assim que se chamam. São brancas com a ponta das asas pretas. Tive que parar o andamento pois aqueles seres lindos estavam cada vez a voar mais perto da minha cara. Tendo ficado a boiar um pouco eles voltaram ao ilhéu. Tentando a sorte e provocando os bichos continuei a nadar. Dez segundos depois lá veio o esquadrão com bicadas para dar. Um episódio espectacular. Os bichos, para além de terem conseguido o que queriam, deixaram-me maravilhado, tal a proximidade com que me brindaram. A natureza no seu melhor. Praia ao lado do Lido, para quem conhece a Madeira.

quinta-feira, maio 05, 2005

5 do 5 do 5

Ao quinto dia do quinto mês do quinto ano do milènio eu dou comigo a pensar que não posso deixar de marcar presença com as palavras e o registo de um post que não pode deixar de se pronunciar quanto à beleza matemática desta data. 5/5/5. Se fosse mais supersticioso, com mais certeza diria que esta é uma data dada a magias e coisas sobrenaturais.
Com desenvoltura falava, com a inconsciência própria da adolescência teimava em apontar, com os cinco dedos da mão fechados, o céu que mais negro do que lhe é costume bailava sobre as nossas cabeças e com a firmeza de se saber filho do presidente bradava que um dia havia de mudar o mundo. São 5 horas da manhã amanhã é dia 6 e o bar está a fechar, já empurram aqueles do canto para o corredor de saída; um deles, o mais embriagado, arrastado pelos outros, gritava com os olhos fechados "e eu que dizia que 2005 iria ser o melhor ano da minha vida". A seguir saímos nós do bar, o filho do presidente da câmara foi sozinho para casa e eu fiquei com a tarefa de levar a mais bela rapariga para casa. De repente, a interromper o silêncio que se fazia, ameno, entre nós, ela declara "a coisa que sempre me atraíu naquele bar foi o telhado de vidro".

quarta-feira, maio 04, 2005

Pura realidade

Levanto-me 4 horas depois de ter acordado, faço a rotina dos afazeres higiénicos e parto para o trabalho meia hora mais cedo para que possa ter tempo de fotocopiar umas páginas necessárias.
Com o passar do tempo, no trabalho, a nuvem que tapava a luz da boa disposição desaparece, desvanece-se, e o sorriso que se desenha no meu rosto não é forçado, é genuíno; porém é tão grande a luz da boa disposição que me vejo a conter o tal sorriso sob pena de me entenderem como um daqueles parvos que, não obstante as menos boas circunstâncias, não param de sorrir.
Chega o tempo do agora. A senhora vai cantarolando umas canções enquanto esfrega com palha de aço as marcas dos ténis que os meninos deixaram no chão. É a rotina dela. A minha a partir de agora perde força. Posso, antes da hora do jantar, fazer o que quiser. Talvez vá contrariar o mau tempo com um mergulho no mar, viver numa ilha tem as suas vantagens: ter toneladas de água, sempre muito perto de mim.
Depois voltarei à rotina do acabar de mais um dia.
Este relato é pura realidade, qualquer semelhança com a ficção é pura coincidência.

terça-feira, maio 03, 2005

Palestra

Foi num instantinho que verifiquei todas as notas que havia feito naquela sessão de esclarecimento à qual todos os empregados foram para, quanto mais não fosse, marcar presença. De outra maneira o patrão iria ficar sentido e certamente marcar a vermelho na sua mente mesquinha o nome de quem faltasse. Eu que pensava não ceder a estas manifestações de prepotência que alguns, porque estão no poder, perpétuam, ali me vi, sentado e calado, como um pato que apanhou constipação e não pode ir para o lago.
Ao sair da sessão amachuquei o papel as notas que tirara e fui embora lançando-o no lixo. Mais tarde voltei à sala, procurei o papel amachucado e depois, ali mesmo verifiquei que minhas suspeitas estavam correctas; era mesmo a Dra. Isabel de Castro que viria daí a um mês fazer uma palestra sobre relações amorosas com incidência na parte da ruptura.
Tenho de ir ver, pensei, não posso perder.
Puta de vida.

segunda-feira, maio 02, 2005

Enquanto peça estou farto

Vou dizer a verdade. Estou completamente farto de dar aulas num ciclo para o qual não fui nem minimamente preparado. O sistema permite-o, eu estou farto. Está errado. Na altura da minha formação eu já me aborrecia com o sistema. Um professor dizia: "mas nós somos o sistema" com o devido respeito que um ex-aluno deve sempre a um professor com sua categoria: Uma ova, professor, nós somos uma peça do sistema. Uma simples peças que se deve adaptar ao todo; e ao tudo que está errado.