Ratos e homens
Passeava com o mar à sua direita.
O paredão, altíssimo, erguia-se á sua esquerda; entre os dois havia uma área
com plantas e flores.
Viu um pequeno rato morto, com a
cabeça esmigalhada e passou por ele. Mas logo voltou atrás para lhe pegar pela
cauda e jogar o animal para o terreno plantado.
Continuou a caminhar até que, com
grande surpresa, viu outro rato, um pouco maior, também morto da mesma maneira.
Agarrou nele e lançou-o para as plantas.
Só depois do passeio pensou que a
sua atitude poderia nem ter sido a mais correcta pois com o passar do tempo os
animais provavelmente iriam exalar o cheiro acre da putrefacção. E nisto de
saber fazer o mal ou o bem, pensou, entre eles há uma ponte enorme onde o
espaço não existe.
Depois de passar o segundo rato
encontrou um homem sentado no chão a chorar. Dizia repetidamente e baixinho,
Matei-o, Matei-o. O primeiro homem, o do passeio, perguntou ao segundo o que
ele tinha matado. Ao que ele respondeu, Um homem, matei um homem. E assim temos
um terceiro.
O primeiro deixou o segundo no
seu pranto e mais á frente encontrou o terceiro. Tinha a boca aberta como se a
preparar-se para falar, e o corpo já estava a esfriar. Pegou nele com cuidado e
ergueu-o em braços não sabendo onde o deixar. Acabou por fazê-lo no primeiro
estabelecimento que encontrou, um pequeno café restaurante. Aqui tem um corpo,
falou alto, Morreu há pouco tempo. Estendeu-o ao comprido no chão e foi-se
embora. Na cabeça um pensamento insurgia-se serena e repetidamente, É bom
existir…é bom existir.