segunda-feira, novembro 20, 2006

Tu

Sem pensar em mais nada deste por ti obcecado pela ideia de a conhecer. Sempre que aparecia ao alcance da tua vista, sentias que ela fazia parte de ti. Iluminava-te. Enchia-te de um bem-estar descomunal. Contudo, uma força superior a ti proibia-te de a abordar. Não sei se a tua parte tímida vencia tudo o resto ou se a outra, a promíscua, havia esgotado a coragem de ousares querer ter mais uma relação.
?O que é preciso para, de um momento para o outro, um homem crente tornar-se céptico? Uma voz interior toma conta de ti e, a acompanhar uma sequência de imagens de toda a tua vida- como se a seguir já não houvesse nada- diz-te com uma tranquilidade apaziguadora:” Bater com a cabeça pela milésima vez! Nesse momento um homem crente pode tornar-se céptico e revolucionar toda a sua maneira de viver.”
Estás na sala, ela entra; mais uma vez compreendes que ela faz parte, como se fosse um prolongamento autónomo com duas pernas, dois braços, uma cabeça, um coração e toda a sua vida desconhecida. O coração está levemente apertado. Observa-la só com a visão periférica e não ousas olhar para o lado para vê-la directamente. Estás satisfeito assim, sabendo que ela está ali. E por outro lado, a imaginação leva-te a pensar que também ela, da mesma forma, dá conta de ti. E essa ideia conforta-te. A imaginação é uma das forças mais poderosas do homem. Tanto nos pode conduzir a um absoluto bem-estar como ao Inferno...
Pega na mala e vai-se embora naquele jeito evidente de quem tem muito para dizer e foi privado de o fazer porque, afinal, ninguém fez as coisas acontecer; ao fim de alguns anos mergulhado nesta sociedade de concreta miscelânea, tens tendência a acreditar que o melhor é não fazer nada, não forçar. A parte difícil é saberes-te agente, tanto da criação como de criação, pelo que aprender a criar sem fazer nada é mais um paradoxo, um conflito, a juntar aos inúmeros que fazem parte da tua existência, condenada a existir. Preso a esse corpo (Platão) que transportas da melhor forma possível, que cuidas e descuidas, que vestes e adornas, que amas, que te liga a tudo o que vive, pensas muitas vezes “vou-me embora, vou deixar isto tudo e andar pelo mundo”. Impossível saber qual é de facto a opção mais acertada. Continuar no seio de um estado que te protege e oferece segurança, ou abandoná-lo rumo ao incerto...As tuas partes genéticas, nómada e sedentária, lutam entre si surdamente, até que um grave apelo surge e elas sobem à arena digladiando-se e, invariavelmente, a sedentária ganha, remetendo a mais forte- a nómada e todas as suas boas características- para o fundo de ti mesmo, onde começa a agitar-se, ganhando novas forças para um novo e mais renhido combate. É isto que tem vindo a acontecer ao longo dos anos. Nas últimas semanas deu-se o último, com nova vitória para a parte sedentária. A nómada foi novamente vencida e rumina lá dentro no cantinho dela; se as coisas continuarem assim(...) um dia transformar-se-á num dragão imbatível.
Ela entra de novo e traz de fora os resquícios de uma conversa com terceiros que a ligam inevitavelmente a ti e que acabam por dar sentido e necessidade a um teu comentário. As primeiras palavras trocadas confirmam os sentimentos que nutres por ela. Mas tens de trabalhar e concentras-te no que estás a fazer. Abdicas dela. É nestas alturas que o trabalho é maldito.

3 Comentários:

Blogger Filipe disse...

Ainda vens a este blog!!??
Beijinhos!

2:55 da tarde  
Blogger Filipe disse...

Saudades é dizer pouco.
Magnífico ver-te por aqui.
Beijos!

2:00 da tarde  
Blogger Erecteu disse...

Belo

10:27 da tarde  

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