quinta-feira, junho 25, 2009

O criminoso

O grito, estridente, ecoou na noite. Os cães acordaram todos ao mesmo tempo começando a ladrar. Saí de casa e, à porta do meu jardim, uma mulher jazia no chão com a garganta cortada. Um homem corria e desaparecia ao fundo do beco. Despi o pijama de flanela e tentei estancar o sangue que jorrava abundantemente. A mulher morreu-me nos braços, olhando com os olhos muito abertos os meus olhos. Num momento anterior ao último batimento cardíaco, reconheci no seu olhar uma cintilação de agradecimento. Os seus lábios esboçaram um ténue sorriso. A mulher morreu em paz e eu fiquei contente.
Pousei a sua cabeça com cuidado e corri na direcção do criminoso. No fim do beco, olhando para a esquerda, vi o homem que corria. Agradeci ao momento por estar em forma e lancei-me atrás dele. Comecei a ganhar terreno e reconheci nele a fadiga. Quando o alcancei ele já corria devagar. Eram 4 da manhã. As ruas estavam desertas. Fiz uma "placagem" e, pronto para tudo, virei o seu rosto na minha direcção. Os seus olhos e rosto estavam carregados de um terror que não sabia existir e não ofereceu resistência. De repente acalmou-se e disse numa voz muito controlada e serena: "Ela era minha mulher. Mereceu morrer."
Eu acreditei nele e larguei-o. Antes de me dirigir para minha casa desejei-lhe boa sorte.
Somos todos geridos por forças que nos podem transcender. Quando cheguei junto ao cadáver da mulher, dois polícias estavam debruçados sobre ela e rodeados de vizinhos.
"Viu o homem que fez isto!" Afirmou a D.Rosa, a rainha da coscuvilhice, alertando os agentes para a minha presença. "Sim, vi D. Rosa! E para a autoridade apontei o beco: "Ele fugiu naquela direcção!"

segunda-feira, junho 22, 2009

Humanidade

Eu gostava de viver numa casa rodeada de solo arável ao lado do Oceano surfável. Gostava de plantar os meus legumes nas horas livres; trabalhar a terra é uma das coisas mais interessantes da vida. Mandar as sementes na hora certa e ver nascer e crescer couves, cenouras, batatas, cebolas, alhos, batatas-doce, nabos, etç.
Tudo direitinho para as panelas. A nossa, e a dos amigos.
Outra coisa interessante na vida: os amigos. Quem não está ciente que a evolução humana leva ao reconhecimento de amigos em tudo o que existe nos reinos animal, vegetal e mineral?
Quem não está ciente disso?
Gostava tanto que todos estivessem cientes disso...

quinta-feira, junho 18, 2009

Não perceber

Eu não percebi o que ela disse. Falou pelos cotovelos e eu não terminei com um “desculpe?”

Fiquei sem saber o que ela tinha experimentado, no âmbito da educação de pais, e que não tinha dado resultado.

A minha disponibilidade intelectual está em pior estado que a afectiva.

As pessoas têm uma personalidade própria, com um discurso próprio. Muitas vezes é preciso um esforço para as compreender. E quando debitam uma quantidade enorme de palavras a coisa começa a agravar-se. Nessas situações, urge interromper para o bem da comunicação. Foi o que não fiz.

Não gosto nada de não perceber o que as pessoas dizem.